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segunda-feira, 20 de abril de 2015

Domingo de Consolação


Geralmente crio o texto primeiro e o título depois, confesso que por falta de criatividade, mas dessa vez não foi assim. Logo veio à mente o que foi o meu domingo, 15 de março de 2015.

Falei a semana toda que estaria lá, na Avenida Paulista, para soltar o meu grito de indignação com tudo o que vem acontecendo com a virada que se deu em 2015.

Em partes também fui afetada pela crise de um certo financiamento que os “clientes” da instituição em que trabalho estão enfrentando para conseguir atualizar o seu contrato e continuar com seus planos. Sei de alguns que já se transferiram para as concorrentes. O que será de nós daqui em diante? Fiquei triste por mim, pelos meus colegas profissionais e pelos tais clientes, que talvez ainda não tenham notado isso, mas, ainda podem se dar muito mal.

Além de mim, meus colegas e dos clientes, imaginei uma possível viagem ao exterior. Comprar dólar como, com o preço nas alturas? Passagem de avião agora, nem pensar. E o visto? Como vou comprovar renda se o holerite ficou reduzido pela metade? E a renovação do aluguel, como vai ficar? Quer saber? Perdeu a graça. E os olhares sobre mim me identificando como sendo de um país corrupto, vão pensar que eu também sou! E com certa razão, embora nenhum julgamento possa ser assim, precipitado, mas é a tal da fama que se estende por onde formos.

Ainda hoje um conhecido veio me contar que teve notícia dos seus familiares, que vivem no Paraguai, e muitos ficaram desempregados porque, além da alta do dólar, está prevista uma nova redução no limite da cota que os brasileiros poderão gastar no exterior sem pagar impostos. Essa redução é comprometedora, pois as vendas vão sofrer mais um grande impacto por lá. Ele estava muito chateado, pois a crise daqui afetou aos trabalhadores de lá.

Tenho diversas pessoas me pedindo indicação para conseguir emprego, também estou à procura, por insegurança com o que será do semestre que vem. Sei de pessoas que estão sem poder andar de ônibus, pois com o aumento de preço que se deu recentemente, e sem emprego, não há como sair de casa pagando a passagem no valor que estão cobrando agora. No mercado, os consumidores estão trocando as marcas de consumo por outras de qualidade inferior, ou isso, ou não levo tudo o que preciso, sendo apenas produtos de primeira necessidade. Que feio que ficou a coisa agora! São apenas alguns exemplos da realidade vivida pelos brasileiros hoje.

Estava descrente e sentindo vergonha do país estar assim, nojo dos políticos e dos brasileiros tão envolvidos nesses escândalos todos. Precisava de um dia de consolo, um dia especial para gritar, expulsar para fora toda a minha ira, todo o meu constrangimento. E foi assim, embora eu estivesse quase amarelando, com medo de uma manifestação que acabasse mal, com violência ou roubos, de uma forte chuva que se pronunciava, do trânsito, enfim, de qualquer coisa que pudesse me manter grudada em casa, bem quietinha e segura no recanto do meu lar. No fundo queria ir!

Fui tomada por um ímpeto que me fez pular e sair de casa correndo para a Paulista. Queria muito protestar, precisava demonstrar minha indignação e não haveria modo melhor do que estar presente numa grande manifestação popular, onde estavam cerca de 1 milhão de pessoas com o mesmo sentimento que eu. 
 
Vesti um jeans, uma camisa verde e fui correndo, como se estivesse a ponto de perder um dos momentos históricos para o país. Quis muito participar, e no caminho pensei em todas as pessoas que convidei e que não quiseram ir comigo; pensei em quem não chamei porque sabia que não poderiam ir; pensei no meu trabalho, nos meus alunos, na dificuldade que eles estão enfrentando agora, na crise hídrica, na crise energética que vem por aí, no preço da passagem de ônibus, na alta do dólar. Pensei nas crianças que precisam urgentemente que nós façamos algo por elas.

Disse à minha amiga Helga que fui protestar na avenida por ela e pela princesinha Larissa, sua filha de 03 anos, que um dia vai ficar orgulhosa quando entender que o país estará numa condição melhor porque uma tia louca foi na maior manifestação dos últimos tempos por ela.

Se a gente não gritar por isso, as coisas ficam como estão. E estar ali, no meio daquela multidão toda me fez acreditar nisso, que juntos somos fortes, juntos vamos mais longe, é na base da união e da manifestação que as maiores revoluções acontecem. É urgente manifestar nossa indignação e fazer uso da pouca “democracia” que temos. Se bem que, ou o país é democrático ou não é, mas quem decide por nós são os políticos. E quem escolhemos para nos representar? Como certas pessoas continuam lá, voltam para lá? A quem damos o poder que temos? E que poder é esse? Somos uma democracia, de fato???

Espero que a geração da Lalá aprenda com os nossos erros e não permita que certos desmandes voltem a acontecer. Que eles desfrutem da bênção que é a democracia, e se lembre que democracia demanda participação popular. Foi o que fiz, quis me sentir cidadã e exercer o meu direito de manifestar minha indignação com a política medonha que hoje nos sufoca.

O problema é em quem confiar? Talvez hoje não haja opção, mas depois dessas manifestações todas, a de domingo e as próximas que poderão vir, aos poucos surjam novas lideranças, novas regras para o jogo político, haja um governo para o povo e não para os ladrões que estão no poder.

Anda bem difícil acreditar nisso, parece uma utopia, pois naquele domingo de consolação o véu caiu e vi a Disneylândia em que vivemos... O mundo de fantasia é aqui, sabia??? Eu vi isso claramente, o quanto o discurso político é mentiroso, falso, nojento e não me engana mais. Não é um discurso dos grandes que me convence, muito menos o da presidente, ou presidenta como ela mesma prefere, mas será a atitude do povo que precisa mudar, começando pelas urnas no dia das eleições e na vigilância que precisamos efetivar sobre os políticos. Um exemplo é consultar a ficha dos candidatos sem esperar pela Lei: você mesmo pode verificar, se ela for suja ou suspeita, não ajude a eleger mais um canalha. É o mínimo que podemos fazer, ou melhor, temos a obrigação de fazer.

Se votaram errado, creio que foi no engano, tentando evitar um dano maior, e agora o resultado está aí, parece que bateu um arrependimento sobre o povo e não tem conserto. Se é que o resultado das urnas foi esse mesmo, não é?! O que pode dar um jeito nisso é a pressão popular, e olhe lá!

Quero ver que pacote anti corrupção será este, prometido no dia seguinte. Fico ansiosa pela tal reforma política e fiscal que disseram fazer. E vou pra rua de novo, se achar preciso.

Para quem não sabe o que é isso, quero relatar um pouquinho da minha experiência e deixar um registro de como se deu essa minha renovação de fé. Quando cheguei na estação do metrô Paulista, que fica na rua da Consolação, já havia, segundo estimativa da Polícia Militar, cerca de 1 milhão de pessoas por lá. E como era fim de tarde, havia um grande grupo em uma lenta dispersão saindo da Paulista em direção ao centro da cidade. Na estação do metrô era imenso o número de pessoas descendo as escadas e formando fila para passar a catraca. Não seria nada bom voltar por ali, era gente demais para eu enfrentar, especialmente se acontecesse algum tipo de agitação.

Saí do metrô e imediatamente segui o grupo que descia a Rua da Consolação. A maioria caminhava com bom humor, disposição, em paz, com faixas, cartazes, fitas no cabelo, roupas nas cores da bandeira, e um grupo levava um tecido verde e azul imenso, com muita gente em baixo para carregá-lo. Me impressionei com a quantidade de famílias presentes, incluindo idosos e crianças. Bonito de se ver! Me assustou um pouco quando algum grupo parava e literalmente começa a xingar com palavrões e muitas provocações aos poucos petistas que estavam nas janelas dos prédios, incitando a ira dos manifestantes. A cena se repetiu algumas vezes.

Pensei na educação, minha mãe não gostaria de me ouvir xingando com palavrões a ninguém, mesmo a quem defenda um governo de base corrupta. Minha educação cristã não me permitiu, embora no fundo meu coração quisesse esganar aquela minoria. Também não fiquei muito à vontade quando a gritaria se voltava à presidente do país. Ela ainda merece um certo respeito por ser mulher, mãe, uma distinta senhora, mas o povo só a via como um tipo de líder da quadrilha, pessoa que deixa ladrões saquear e afundar o nosso barco.

Por um lado acabei entendendo que não se tratava de educação, mas de revolta, de liberar geral, mas ser democrático exige uma postura digna, concordam comigo?

Democracia é participação popular com respeito, deixar que o outro também exerça o direito de se manifestar, ainda que em opinião contrária. Sem educação e respeito não se exerce democracia. Foi esta a lição que levei para casa, ou melhor, com a qual saí de casa para o protesto. Fiquei com medo de haver uma excitação ainda maior e alguém partir para a baixaria da violência, e tudo perderia a graça outra vez. Que bom, ficamos na paz, o tempo todo.

Não percebi se foi em locais estratégicos, mas o grupo caminhava alguns metros e parava, os “puxadores” davam o tom de frases e breves cantorias, o povo gritava, aplaudia e continuava a caminhada. Numa dessas paradinhas vinha o Hino do Brasil, em outra o famoso “sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor”, “Lula cachaceiro, devolve o meu dinheiro”, e o meu preferido, para agitar geral: “quem não pula quer a Dilma....quem não pula quer a Dilma”....foi impossível não pular bem alto e rir muito, pois foi a cara do Brasil, teve um tom de humor e ironia que de fato envolveu a todos.

Como numa prece, o grupo do centro se ajoelhou, pouco a pouco todos foram fazendo o mesmo...que pena que naquele instante não havia nenhuma câmera de televisão para registrar o momento que me pareceu sagrado...cantamos uma parte do Hino Nacional em pela avenida, de joelhos no chão, como quem clama pela Pátria Amada...salve, salve. 

Foi aí que me dei conta do quanto é profundo um ato democrático como aquele, especialmente para quem precisava recuperar o orgulho de ser brasileiro, a fé na juventude, nos estudantes, no povo. Se não é nos políticos em quem podemos confiar, ainda temos a força da nossa alma, o amor no coração para crer e lutar por um futuro melhor.











Foi lindo, incrível e talvez indescritível a sensação que tive ali, no meio do meu povo... pude verdadeiramente vislumbrar dias melhores que, agora sei, certamente virão.

Quer saber? Valeu ter ido! Recomendo a quem ainda não vivenciou uma experiência assim, sensação de luta por um Brasil melhor para mim e para vocês. Desci toda a consolação, e não por acaso saí de lá me sentindo leve, aliviada, ou, como não esperava: “consolada”!!! Teve até a presença de um tímido arco-íris, dá pra ver na foto???   


Brasil, senti em você uma pátria desprezada por alguns políticos, mas amada pelo povo brasileiro. Por isso fui às ruas e convido: na próxima, #vemprarua você também...

P.S.: Recomendo o site do amigo Ricardo Lima, um cara que não apenas tem boas ideias, mas procura colocá-las em prática  - 

 www.leisdeincentivopopular.org.br

Talita Godoy
15/03/2015


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