Geralmente crio o texto primeiro
e o título depois, confesso que por falta de criatividade, mas dessa vez não
foi assim. Logo veio à mente o que foi o meu domingo, 15 de março de 2015.
Falei a semana toda que estaria
lá, na Avenida Paulista, para soltar o meu grito de indignação com tudo o que
vem acontecendo com a virada que se deu em 2015.
Em partes também fui afetada pela
crise de um certo financiamento que os “clientes” da instituição em que
trabalho estão enfrentando para conseguir atualizar o seu contrato e continuar
com seus planos. Sei de alguns que já se transferiram para as concorrentes. O
que será de nós daqui em diante? Fiquei triste por mim, pelos meus colegas
profissionais e pelos tais clientes, que talvez ainda não tenham notado isso,
mas, ainda podem se dar muito mal.
Além de mim, meus colegas e dos
clientes, imaginei uma possível viagem ao exterior. Comprar dólar como, com o
preço nas alturas? Passagem de avião agora, nem pensar. E o visto? Como vou
comprovar renda se o holerite ficou reduzido pela metade? E a renovação do
aluguel, como vai ficar? Quer saber? Perdeu a graça. E os olhares sobre mim me
identificando como sendo de um país corrupto, vão pensar que eu também sou! E
com certa razão, embora nenhum julgamento possa ser assim, precipitado, mas é a
tal da fama que se estende por onde formos.
Ainda hoje um conhecido veio me
contar que teve notícia dos seus familiares, que vivem no Paraguai, e muitos
ficaram desempregados porque, além da alta do dólar, está prevista uma nova
redução no limite da cota que os brasileiros poderão gastar no exterior sem
pagar impostos. Essa redução é comprometedora, pois as vendas vão sofrer mais
um grande impacto por lá. Ele estava muito chateado, pois a crise daqui afetou
aos trabalhadores de lá.
Tenho diversas pessoas me pedindo
indicação para conseguir emprego, também estou à procura, por insegurança com o
que será do semestre que vem. Sei de pessoas que estão sem poder andar de
ônibus, pois com o aumento de preço que se deu recentemente, e sem emprego, não
há como sair de casa pagando a passagem no valor que estão cobrando agora. No
mercado, os consumidores estão trocando as marcas de consumo por outras de
qualidade inferior, ou isso, ou não levo tudo o que preciso, sendo apenas produtos
de primeira necessidade. Que feio que ficou a coisa agora! São apenas alguns
exemplos da realidade vivida pelos brasileiros hoje.
Estava descrente e sentindo
vergonha do país estar assim, nojo dos políticos e dos brasileiros tão
envolvidos nesses escândalos todos. Precisava de um dia de consolo, um dia
especial para gritar, expulsar para fora toda a minha ira, todo o meu
constrangimento. E foi assim, embora eu estivesse quase amarelando, com medo de
uma manifestação que acabasse mal, com violência ou roubos, de uma forte chuva
que se pronunciava, do trânsito, enfim, de qualquer coisa que pudesse me manter
grudada em casa, bem quietinha e segura no recanto do meu lar. No fundo queria ir!
Fui tomada por um ímpeto que me
fez pular e sair de casa correndo para a Paulista. Queria muito protestar,
precisava demonstrar minha indignação e não haveria modo melhor do que estar
presente numa grande manifestação popular, onde estavam cerca de 1 milhão de
pessoas com o mesmo sentimento que eu.
Vesti um jeans, uma camisa verde
e fui correndo, como se estivesse a ponto de perder um dos momentos históricos
para o país. Quis muito participar, e no caminho pensei em todas as pessoas que
convidei e que não quiseram ir comigo; pensei em quem não chamei porque sabia
que não poderiam ir; pensei no meu trabalho, nos meus alunos, na dificuldade
que eles estão enfrentando agora, na crise hídrica, na crise energética que vem
por aí, no preço da passagem de ônibus, na alta do dólar. Pensei nas crianças
que precisam urgentemente que nós façamos algo por elas.
Disse à minha amiga Helga que fui
protestar na avenida por ela e pela princesinha Larissa, sua filha de 03 anos,
que um dia vai ficar orgulhosa quando entender que o país estará numa condição
melhor porque uma tia louca foi na maior manifestação dos últimos tempos por
ela.
Se a gente não gritar por isso, as coisas ficam como estão. E estar
ali, no meio daquela multidão toda me fez acreditar nisso, que juntos somos fortes, juntos vamos mais
longe, é na base da união e da manifestação que as maiores revoluções
acontecem. É urgente manifestar nossa indignação e fazer uso da pouca
“democracia” que temos. Se bem que, ou o país é democrático ou não é, mas quem
decide por nós são os políticos. E quem escolhemos para nos representar? Como
certas pessoas continuam lá, voltam para lá? A quem damos o poder que temos? E
que poder é esse? Somos uma democracia, de fato???
Espero que a geração da Lalá
aprenda com os nossos erros e não permita que certos desmandes voltem a
acontecer. Que eles desfrutem da bênção que é a democracia, e se lembre que
democracia demanda participação popular. Foi o que fiz, quis me sentir cidadã e exercer o meu direito de manifestar minha
indignação com a política medonha que hoje nos sufoca.
O problema é em quem confiar?
Talvez hoje não haja opção, mas depois dessas manifestações todas, a de domingo
e as próximas que poderão vir, aos poucos surjam novas lideranças, novas regras
para o jogo político, haja um governo para o povo e não para os ladrões que
estão no poder.
Anda bem difícil acreditar nisso,
parece uma utopia, pois naquele domingo de consolação o véu caiu e vi a Disneylândia em que vivemos... O mundo
de fantasia é aqui, sabia??? Eu vi isso claramente, o quanto o discurso
político é mentiroso, falso, nojento e não me engana mais. Não é um discurso
dos grandes que me convence, muito menos o da presidente, ou presidenta como
ela mesma prefere, mas será a atitude do
povo que precisa mudar, começando pelas urnas no dia das eleições e na
vigilância que precisamos efetivar sobre os políticos. Um exemplo é consultar a
ficha dos candidatos sem esperar pela Lei: você mesmo pode verificar, se ela
for suja ou suspeita, não ajude a eleger mais um canalha. É o mínimo que
podemos fazer, ou melhor, temos a obrigação de fazer.
Se votaram errado, creio que foi no
engano, tentando evitar um dano maior, e agora o resultado está aí, parece que
bateu um arrependimento sobre o povo e não tem conserto. Se é que o resultado
das urnas foi esse mesmo, não é?! O que pode dar um jeito nisso é a pressão
popular, e olhe lá!
Quero ver que pacote anti
corrupção será este, prometido no dia seguinte. Fico ansiosa pela tal reforma
política e fiscal que disseram fazer. E vou pra rua de novo, se achar preciso.
Para quem não sabe o que é isso,
quero relatar um pouquinho da minha experiência e deixar um registro de como se
deu essa minha renovação de fé. Quando
cheguei na estação do metrô Paulista, que fica na rua da Consolação, já havia,
segundo estimativa da Polícia Militar, cerca de 1 milhão de pessoas por lá. E
como era fim de tarde, havia um grande grupo em uma lenta dispersão saindo da
Paulista em direção ao centro da cidade. Na estação do metrô era imenso o
número de pessoas descendo as escadas e formando fila para passar a catraca.
Não seria nada bom voltar por ali, era gente demais para eu enfrentar,
especialmente se acontecesse algum tipo de agitação.
Saí do metrô e imediatamente
segui o grupo que descia a Rua da Consolação. A maioria caminhava com bom
humor, disposição, em paz, com faixas, cartazes, fitas no cabelo, roupas nas
cores da bandeira, e um grupo levava um tecido verde e azul imenso, com muita
gente em baixo para carregá-lo. Me impressionei com a quantidade de famílias
presentes, incluindo idosos e crianças. Bonito de se ver! Me assustou um pouco
quando algum grupo parava e literalmente começa a xingar com palavrões e muitas
provocações aos poucos petistas que estavam nas janelas dos prédios, incitando
a ira dos manifestantes. A cena se repetiu algumas vezes.
Pensei na educação, minha mãe não
gostaria de me ouvir xingando com palavrões a ninguém, mesmo a quem defenda um
governo de base corrupta. Minha educação cristã não me permitiu, embora no
fundo meu coração quisesse esganar aquela minoria. Também não fiquei muito à
vontade quando a gritaria se voltava à presidente do país. Ela ainda merece um
certo respeito por ser mulher, mãe, uma distinta senhora, mas o povo só a via
como um tipo de líder da quadrilha, pessoa que deixa ladrões saquear e afundar
o nosso barco.
Por um lado acabei entendendo que não se tratava de educação, mas de
revolta, de liberar geral, mas ser democrático exige uma postura digna,
concordam comigo?
Democracia é participação popular com respeito, deixar que o outro
também exerça o direito de se manifestar, ainda que em opinião contrária. Sem
educação e respeito não se exerce democracia. Foi esta a lição que levei
para casa, ou melhor, com a qual saí de casa para o protesto. Fiquei com medo
de haver uma excitação ainda maior e alguém partir para a baixaria da violência,
e tudo perderia a graça outra vez. Que bom, ficamos na paz, o tempo todo.
Não percebi se foi em locais
estratégicos, mas o grupo caminhava alguns metros e parava, os “puxadores”
davam o tom de frases e breves cantorias, o povo gritava, aplaudia e continuava
a caminhada. Numa dessas paradinhas vinha o Hino do Brasil, em outra o famoso
“sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor”, “Lula cachaceiro, devolve o
meu dinheiro”, e o meu preferido, para agitar geral: “quem não pula quer a
Dilma....quem não pula quer a Dilma”....foi impossível não pular bem alto e rir
muito, pois foi a cara do Brasil, teve um tom de humor e ironia que de fato
envolveu a todos.
Como numa prece, o grupo do centro se ajoelhou, pouco a pouco todos
foram fazendo o mesmo...que pena que naquele instante não havia nenhuma câmera
de televisão para registrar o momento que me pareceu sagrado...cantamos uma
parte do Hino Nacional em pela avenida, de joelhos no chão, como quem clama
pela Pátria Amada...salve, salve.
Foi aí que me dei conta do quanto é profundo um ato democrático como
aquele, especialmente para quem precisava recuperar o orgulho de ser
brasileiro, a fé na juventude, nos estudantes, no povo. Se não é nos políticos
em quem podemos confiar, ainda temos a força da nossa alma, o amor no coração
para crer e lutar por um futuro melhor.
Foi lindo, incrível e talvez
indescritível a sensação que tive ali, no meio do meu povo... pude
verdadeiramente vislumbrar dias melhores que, agora sei, certamente virão.
Quer saber? Valeu ter ido!
Recomendo a quem ainda não vivenciou uma experiência assim, sensação de luta
por um Brasil melhor para mim e para vocês. Desci toda a consolação, e não por
acaso saí de lá me sentindo leve, aliviada, ou, como não esperava: “consolada”!!! Teve até a presença de um tímido arco-íris, dá pra ver na foto???
Brasil, senti em você uma pátria
desprezada por alguns políticos, mas amada pelo povo brasileiro. Por isso fui
às ruas e convido: na próxima, #vemprarua você também...
P.S.: Recomendo o site do amigo Ricardo Lima, um cara que não apenas tem boas ideias, mas procura colocá-las em prática -
www.leisdeincentivopopular.org.br
Talita Godoy
15/03/2015
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