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quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Revista Realidade / Considerações Finais da Dissertação por Talita Godoy


Este post é a parte final da dissertação "Revista Realidade - Representações da sociedade na mídia impressa brasileira em 1966/1967 - tempos de transformações políticas e socioculturais"



4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

            O estudo aqui apresentado partiu de duas vertentes: a primeira delas analisando o produto revista, em sua forma de se comunicar com o publico leitor (viés jornalístico) e a segunda analisando o público leitor em relação à sua receptividade (viés social).
       Como características principais do produto, foi possível concluir que a revista Realidade abordava temas polêmicos, desvendava tabus, utilizava-se de uma linguagem própria e diferenciada no trato de assuntos de interesse dos leitores. Estes, por vivenciarem um período de mudanças em termos tecnológicos e comportamentais, interessavam-se por temas como política, religião, comportamento, a liberação sexual, os debates sobre questões como desquite, aborto, preconceito racial e tantos outros que permeavam a sua época.  
          Uma das diferenças entre a forma de abordar os mesmos assuntos de outras revistas era procurar o periférico dos temas obrigatórios. Enquanto a imprensa em geral noticiava um fato, Realidade buscava outros pontos de vista, como no caso citado dos artistas em que o foco de uma entrevista ia além do trivial, entrando em campos mais específicos.
Outro ponto relevante era a escolha dos locais, buscando personagens desconhecidos em lugares distantes das grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro, abarcando, assim, cidades do interior, indo de Norte a Sul do país. O fato de não ter um tempo determinado para a produção das reportagens dava maior liberdade para que o repórter pesquisasse e observasse os fatos até encontrar o que precisava para criar um texto diferenciado. A especialização dos seus repórteres vinha dessa liberdade criativa e da dedicação individual com que cada um se empenhava na missão de produzir algo inédito. O texto somava-se à qualidade das fotografias integradas um com o outro, formando uma unidade que também se caracteriza como um dos pontos fortes da revista.
Alguns dos temas eram tão atuais ou revolucionários, que até para os dias de hoje são pauta nos principais meios de comunicação, como os problemas de ordem nacional, por exemplo. Já as questões de ordem sociocultural, causaram muita polêmica, comentadas nas cartas dos leitores ou mesmo nas apreensões e ameaças pelas quais a revista passou. Alguns desses temas hoje contam com um comportamento social oposto daquela época, e provavelmente a mudança teve influência de veículos de informação como a revista Realidade, que colocava em pauta os assuntos para provocar reflexão no seu público leitor. 
Fatos que nos levam a concluir o quanto a revista Realidade - por meio do trabalho dos seus editores, fotógrafos e repórteres - levou de contribuição jornalística à sociedade brasileira no final dos anos 1960, propondo discussões e reflexões em torno de questões polêmicas, preconceitos e tabus, apresentando seu ponto de vista sobre determinado assunto.
Por ter rompido alguns paradigmas, especialmente na forma de produzir e editar seus textos, no espaço aberto aos leitores e na forma como se comunicava com ele por seus editoriais, muitas vezes justificando alguma ordem política, nos passam a impressão de uma sociedade em movimento, receptiva a um veículo de imprensa inovador, audacioso no tocante aos assuntos específicos e pertinentes à sua época. Provavelmente até esgotados, de tão mencionados.
E como visto, embora fosse um sucesso grandioso em todo país, não agradou a todos, especialmente a uma ala da sociedade mais conservadora, ou de influência institucional, seja religiosa, familiar ou mesmo política, mas, em geral, o número crescente de vendas legitimava o seu discurso e a fez continuar até que os motivos de força política a fizessem se descaracterizar, deixando de ser o que era originalmente, perdendo seu time de repórteres, e finalmente encerrando sua primeira fase, no qual se baseou esse estudo.
Por fim, concluímos que a revista Realidade influenciou uma geração na sua prática sociocultural e continua a inspirar estudos que não se esgotam por ser um material rico em elementos que sempre despertam a atenção daqueles que procuram compreender mais sobre comunicação social.

Esperamos que este estudo tenha atendido ao apelo dos ex repórteres da revista, José Carlos Marão e José Hamilton Ribeiro, que comentaram sobre a falta de pesquisas sobre a sua importância como influência nas mudanças culturais ocorridas naquele período. Neles, e demais repórteres da revista Realidade, foi inspirado esse estudo, pois o que somos hoje veio das referências do passado. A atitude, a escolha e a ousadia daqueles repórteres produziram algo que definitivamente abriu passagem para um novo tempo.