Resumo da aula 11
Disciplina: Sincretismo Textual e Estudos de Gênero
Texto: O Enigma da Igualdade
Autora: Joan W. Scott – Princeton University
O texto foi publicado no Brasil na edição janeiro-abril/2005, da revista Estudos Femininos, de Florianópolis. Se propõe a discutir sobre igualdade e diferença, identidades individuais e grupo. É um texto que nos provoca a reflexão, e como a autora diz, vem oferecer paradoxos, e não problemas fáceis de serem resolvidos.
Conceitos que parecem opostos, mas se colocados assim, deixam de ter percebidas os suas interconexões: “...reconhecer e manter uma tensão necessária entre igualdade e diferença, entre direitos individuais e identidades grupais, é o que possibilita encontrarmos resultados melhores e mais democráticos” (p. 12).
Em alguns momentos do texto a autora usa o termo “ação afirmativa”, entendida como um conjunto de medidas do Estado para eliminar desigualdades; visa combater desigualdades prestando incentivo e suporte aos que precisam (em certo caso, aos ofendidos). A ação afirmativa se distingue da “discriminação positiva”, esta mexe na norma, como por exemplo a criação de cotas para negros ou deficientes físicos. Scott cita que a ação afirmativa tem sido atacada como “uma forma de preferência de grupo que discrimina indivíduos” (p.12) e alerta: “A questão de onde e de como reconhecer grupos de identidade e de quando ignorá-los também se estende aos espaços econômicos e políticos”(p.12).
Grupos X Indivíduos
Grupos X Indivíduos
Os chamados grupos criam padrões nos quais os indivíduos deverão se encaixar, ou seja, seguir para pertencer. Neste ponto do texto, Scott apresenta a definição de paradoxo: “preposição que não pode ser desenvolvida e que é falsa e verdadeira ao mesmo tempo” (p. 13) e cita o exemplo do mentiroso quando diz: “estou mentindo”.
Desta forma a autora explica a razão do paradoxo. Diferença e igualdade, assim como indivíduo e grupo não são opostos, e sim conceitos interdependentes, sempre sob tensão.
Os paradoxos apresentados por Scott no texto são os seguintes (p. 15):
1. “A igualdade é um princípio absoluto e uma prática historicamente contingente.
2. Identidades de grupo definem indivíduos e renegam a expressão ou percepção plena de sua individualidade.
3. Reivindicações de igualdade envolvem a aceitação e a rejeição da igualdade de grupo atribuída pela discriminação. Ou, em outras palavras: os termos de exclusão sobre os quais essa discriminação está amparada são ao mesmo tempo negados e reproduzidos nas demandas pela inclusão”.
A autora expõe suas ideias e começa pelo seguinte conceito, igualdade: “não é a ausência ou a eliminação da diferença, mas sim o reconhecimento da diferença e a decisão de ignorá-la ou de levá-la em consideração.
Igualdade
A igualdade está na decisão em minimizar as diferenças ou mesmo em ignorar sua existência.
No exemplo da Revolução Francesa, a igualdade surge como elemento de princípio geral, para todos, porém na prática, ela favorecia apenas àqueles que possuíam propriedades, sendo negada aos mais pobres; aos escravos, até 1794, por serem propriedade de outros; às mulheres, pois a maternidade e os deverem para com o lar lhe impediam de participara da política. Estes não eram qualificados para exercerem a cidadania, que se baseava na capacidade de ter pensamento autônomo, como tinham os que possuíam propriedades, por exemplo.
Alguns revolucionários surgiam com alta voz para defender os direitos da mulher na cidadania, porém estes mesmos já não defendiam o direito nos negros. Scott cita o marquês de Condorcet.
Na matemática, igualdade significa “quantidades idênticas de coisas, correspondências exatas”, segundo o dicionário Oxford. Porém Scott lembra que como conceito social, a igualdade não tem a mesma medida, sendo menos precisa, variando de tempos em tempos. Assim também em certas ocasiões “a igualdade pertence ao indivíduo, a exclusão aos grupos” (p. 17). Esta menção é feita no exemplo dado quanto à discriminação da mulher, ainda no caso da igualdade de cidadania para homens e mulheres em que ela pertencia a uma “categoria de pessoas com características específicas”, por isso se diferenciavam dos homens. O homem era considerado um indivíduo, ímpar; ela era pertencente a um padrão geral.
Logo depois do período da Revolução Francesa veio a luta do voto para todos, ou melhor, para todos os homens. Ela começou com os trabalhadores social-democratas, que leva a autora ao segundo ponto de análise: “era como trabalhadores, e não como indivíduos que esses homens exigiam reconhecimento de seus direitos individuais” (p. 17).
Scott cita algo muito interessante sobre as feministas, que mesmo sendo mais de 50% da população (francesa), elas se referem a este grupo como sendo de “minorias”. A autora atribui à razão aos “diferenciais de poder entre homens e mulheres” (p.18). Relações de poder.
Ela cita dois exemplos. Do trabalhador que na verdade não gostava do seu trabalho, mas o usava, enquanto “trabalhador”, para defender a causa da cidadania e da individualidade; o outro, de uma feminista que defendia o direito da mulher ser cidadã, alegando que com isso deixaria de pensar em si mesma como “fêmea” e passaria a pensar em si como cidadã. Em ambos os casos, mesmo dentro do grupo eles se diferenciavam, evidenciavam as diferenças.
“Pelo fato de agir a favor das mulheres, o feminismo produziu a diferença sexual, que buscava eliminar – chamando a atenção exatamente para a questão que queria eliminar” (p. 21).
Para Scott, as diferenças são uma forma de organização social, por isso não podem ser resolvidas. Também por isso as resoluções políticas não devem funcionar; a ação afirmativa é imperfeita. “Visando acabar com a discriminação, não apenas chamou a atenção sobre a diferença, como também a abraçou. Visando a tornar a identidade de grupo no tratamento com os indivíduos, ela retificou a identidade do grupo. Não havia outra escolha” (p. 23).
Na teoria democrática liberal, o indivíduo tem garantida a igualdade perante a lei, mas na sociedade, os indivíduos são diferentes: “sua desigualdade repousa em diferenças presumidas entre eles, diferenças que não são singularmente individualizadas, mas tomadas como sendo categóricas. A identidade de grupo é o resultado dessas distinções categóricas atribuídas” (p. 23).
Pertencer ao grupo pode dificultar a igualdade do individuo perante a lei. O problema, portanto, não é o indivíduo, mas “a abstração do conceito de indivíduo mascara a particularidade da sua figuração... a ação afirmativa tem como premissa o indivíduo abstrato e a ficção de sua universalidade” (p.24).
Para eliminar a exclusão, foi preciso que a inclusão se desse ao indivíduo com membros daquele grupo que o excluía, por assim dizer. Então, “para reverter a discriminação, deve-se praticá-la (mas com uma diferença – uma finalidade positiva)” (p. 24).
Scott cita em seu texto o “Plano Filadélfia”, que contrataria as minorias para trabalhar na construção civil. Ela aponta suas dimensões contraditórias como ação afirmativa. Por outro lado, a autora cita seus benefícios, como “um esforço para equilibrar interesses contrários: de direitos e de necessidades; de indivíduos, grupos e do bem coletivo da nação” (p. 26). Outros casos são citados, como o da Universidade do Texas e o caso Hopwood.
Para Scott: “faz mais sentido perguntar como os processos de diferenciação operam e desenvolver análises de igualdade e discriminação que ratem as identidades não como identidades eternas, mas como efeitos de processos políticos e sociais” (p. 29).
E finaliza: “a política tem sido descrita como a arte do possível; eu preferiria chamá-la de negociação do impossível...” (p. 29).
Talita Godoy
11/05/2011**************